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JESUS CRISTO Realmente Existiu? Segunda parte


– AS FONTES

Já vimos que algumas pessoas afirmam que Jesus não existiu, alegando que Sua vida e o seu Evangelho foram criações da Igreja. Esta afirmação está baseada, principalmente nos poucos registros históricos disponíveis sobre o homem Jesus e até sobre o cristianismo, que – na verdade – só começou a ser registrado por fontes seculares (não cristãs) quando começou a incomodar.

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Neste post vamos começar a estudar as principais fontes históricas deste nazareno que viveu a cerca de 2000 anos atrás.

As fontes que hoje dispomos para o conhecimento do homem Jesus, no sentido histórico são: (1) Os livros canônicos do novo testamento; (2) As obras de Flávio Josefo; (3) Tácito e outros autores pagãos do século II dC; (4) Fontes judaicas de Qumran e os rabinos; (5) As Agrapha(palavras e atos não escritos de Jesus); (6) Evangelhos apócrifos (não acolhidos no cânon cristão); (7) Material de NagHammadi (especialmente o Evangelho de Tomé).[1]

Este post vai se concentrar no estudo dos livros canônicos do Novo Testamento.

(1) OS LIVROS CANÔNICOS DO NOVO TESTAMENTO:

Livros canônicos são os que a Igreja reconheceu como sendo aqueles que transmitem autenticamente a tradição apostólica e foram inspirados por Deus.

São quatro Evangelhos: Mateus, Marcos, Lucas e João; os Atos dos Apóstolos, escritos por São Lucas; quatorze epístolas de São Paulo, (uma) aos Romanos, duas aos Coríntios, (uma) aos Gálatas, aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses, duas aos Tessalonicenses, duas a Timóteo, (uma) a Tito, a Filêmon, aos Hebreus; duas de São Pedro, três de São João, uma do apóstolo Tiago, uma de Judas, e o Apocalipse de São João.[2]Desde que foi proposto por Santo Ireneu de Leão nos finais do séc. II (AdversusHaereses3.11.8-9) estes escritostem sido mantidospela Igreja e, finalmente, foram estabelecidos como dogma de fé ao definir o cânone das Sagradas Escrituras no Concílio de Trento (1545-1563).

Um dos historiadores da igreja primitiva, o bispo Eusébio de Cesaréia (século IV), afirmava que os apóstolos e os evangelistas nunca tiveram em mente deixar qualquer coisa por escrito, considerando que a maioria dos apóstolos só escreveu em situações especiais, como a impossibilidade de viajar para alguma comunidade.[3]No entanto, no ano 100 d.C., todos os 27 volumes canônicos do Novo Testamento já estavam escritos, mas não havia ainda uma lista autorizada dos livros que o compunham. No próprio texto do Novo Testamento não consta uma lista dos livros que devem ser considerados sagrados. Somente em II Pedro 3:15-16, o apóstolo refere que os escritos de São Paulo são sagrados, mas não os relaciona e nem informa quais seriam os outros livros sagrados.Provavelmente a referência mais antiga que se tem sobre o cânon do Novo Testamento está em um manuscrito descoberto pelo sacerdote italiano Ludovico AntonioMuratori no século XVIII, datado do século II (cânon de Muratori). Neste documento já estão os quatro evangelhos, as cartas de São Paulo, a Epístola de Judas as Epístolas I e II de São João e o Apocalipse. Não aparecem as epístolas aos Hebreus, a de Tiago e nem as de São Pedro.[4]

Sem dúvida a principal fonte de conhecimento do Jesus histórico são os quatro Evangelhos Canônicos (Marcos, Mateus, Lucas e João), mas ao mesmo tempo, é também, o maior problema quando se pensa em historicidade. É preciso considerar que os Evangelhos não são obras de história, no sentido estrito, e o objetivo delesé reforçar a fé em Jesus como filho de Deus, Senhor e Messias. Além disso, eles não pretendem proporcionar aos leitores uma narrativa da vida de Jesus. Marcos e João apresentam apenas um Jesus adulto cujo ministério não dura mais do que uns poucos anos, Mateus e Lucas dedicam dois capítulos sobre a infância de Jesus – com uma historicidade muito discutível. O pior é ainda, que não sabemos quase nada sobre a sequência dos fatos relatados nos Evangelhos ditos sinópticos (Marcos, Mateus e Lucas). Uma análise profunda aponta para uma possível base dos Evangelhos em Marcos, o mais antigo, e uma compilação dos outros dois Sinópticos que – apesar disso – não conservaram a ordem cronológica dos eventos.[5] Para aumentar a confusão, João se afasta muito dos outros. Por exemplo, concentra o ministério de Jesus na Judéia e em Jerusalém enquanto os sinópticos o fazem na Galiléia. As diversas tentativas de criar uma harmonia cronológica dos quatro Evangelhos têm sido absolutamente especulativas e funciona mais como um esquema teológico artificial.[6] Outro problema é, sem dúvida, a preservação das palavras de Jesus nos Evangelhos. O maior pesquisador neste campo, Joachim Jeremias, conseguiu reconstituir o original aramaico com diversos ditos autênticos de Jesus.[7] Mesmo assim, as conclusões científicas indicam que as diversas formas de falas de Jesus que aparecem ao longo dos Evangelhos, dificilmente podem ser apontadas como forma original.

Apesar destes problemas, a comunidade científica hoje está coesa com o fato de que o trabalho de colocar tudo o que aconteceu com aquele “judeu marginal” por escrito não foi feito rapidamente, e provavelmente não tenha sido programado. Entre os especialistas, há consenso em pensar que os judeus, pretendendo permanecer fiéis à religião dos seus pais, dificilmente teriam inventado uma “fábula”sobre Jesus que, nos pontos essenciais, mostra-se contraditória com a fé judaica ortodoxa. Ao contrário, estes “farsantes ou sonhadores”, fazendo apologia do seu Mestre, Jesus, como Filho de Deus mostrou um judeu recebendo o batismo de penitência administrado por João, anunciando a data do último dia e desfazendo o messianismo esperado pelos próprios judeus.[8] Além disso, as divergências sutis dos Evangelhos sinópticos e o viés de São João é um bom sinal: está claro que não existe um modelo dominante que teriam recompilado mais ou menos fielmente. A relativa independência das testemunhas é, na verdade, uma garantia de autenticidade.

Fora dos quatro Evangelhos, aprincipal fonte de informação sobre Jesus é São Paulo, pertencente à primeira geração de cristãos, mesmo considerando que nem todas as suas Epístolas tenham sido, realmente, escritas por ele. Além disso, como o núcleo da sua teologia é a morte e a ressurreição de Jesus, os fatos e as palavras do Jesus terreno não tem grande presença em seus escritos.[9] Todavia nos casos em que há problemas, como em Corinto, São Paulo é obrigado a repetir a doutrina básica e aí, então, recorre às palavras de Jesus e aos acontecimentos de sua vida. Por exemplo, para defender a forma de prover seu próprio sustento, Paulo cita Jesus sobre o sustento dos missionários (1Coríntios 9:14; cf. Mateus 10:10; Lucas 10:7). Assim também, quando percebe ausência de caridade nas Eucaristias coríntias, Paulo recorda as ações e palavras de Jesus na Última Ceia (1Coríntios 11:23:26).

Esses fatos acerca dos ensinamentos de Paulo são particularmente importantes, pois, independentes dos Evangelhos, há uma “aplicação” dos ensinamentos em situações novas. Em 1Coríntios 7:10-13 há uma cuidadosa distinção entre o que Jesus disse a respeito do divórcio (por exemplo Marcos 10:11-12) e o casamento entre cristãos e pagãos, que jamais foi tratado por Jesus.

A Epístola de Tiago e outras do Novo Testamento contém alguns ditos reformulados de Jesus. Por exemplo, a proibição de jurar em Tiago 5:12 (cf. Mateus 5:34-37). A primeira Epístola de São Pedro, a Epístola aos Hebreus e o Apocalipse de São João também usam palavras que foram ditas diretamente por Jesus.1 Aqui está o problema: será que as palavras do Jesus histórico foram colocadas na boca do Cristo ressuscitado (na visão de quem vislumbrou os acontecimentos) ou, ao contrário, os escritores cristãos, após ouvirem essas palavras em suas visões do Senhor ressuscitado as teriam colocado na boca do Jesus histórico?6 Ambas as possibilidades rementem para um interessante exercício de historicidade pois aparecem, independentemente, em vários escritos do Novo Testamento e, novamente, esta independência é sinal de autenticidade para os exegetas.1

Pe. Rafael Pinto

Silvio Prietsch

[1]MEIER, John. A Marginal Jew: RethinkingtheHistorical Jesus, Anchor Yale BibleReference Library,2009.

[2]METZGER, Bruce M.The Canon ofthe New Testament: Its Origin, Development, andSignificance. [S.l.]: Oxford University Press, March 13, 1997. 246 p.

[3]CESAREIA, Eusébio de. História Eclesiástica : The Orderofthe Gospels. [S.l.: s.n.]. Capítulo: 24,3-7. , vol. III, 2009.

[4]LIMA, Alessandro. O Cânon Bíblico - A Origem da Lista dos Livros Sagrados. São José dos Campos-SP: Editora COMDEUS, 2007.

[5]STUHLMACHER,Peter.Das Evangeliumund die Evangelien, Tübingen ,also in English: The Gospel andthe Gospels.1983.

[6]PASQUERO, Fedele. O Mundo da Bíblia, Autores Vários. São Paulo: Paulinas, 1986.

[7] JEREMIAS, J. Jesus andtheMessageofthe New Testament, editedby K. C. Hanson, FortressClassics in BiblicalStudies, 2002.

[8]BROWN,Raymond andMEIER,John. AntiochandRome: New TestamentCradlesofCatholicChristianity,Paulist Press. Scroll toTableofContentschapter-preview, 1983.

[9]DUNGAN,David. New TestamentStudies: Literary, Historical, andTheological.Editedby Allan J. McNicol, J. Samuel Subramanian, and David B. Peabody. T & T Clark International, 2009.

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